sexta-feira, 4 de fevereiro de 2011

Wilson Simonal na Odeon [1961-1971]

Caixinha supimpa. O brother comprou, e além de eu recomendar a compra a quem pode (nada como um projeto gráfico decente para cada Cd e um livreto altamente informativo), me senti impelido a compartilhar o som magistral que invadiu minha casa. Enquanto devorava cada novo álbum, postava no mediafire, e tuitava o respectivo link. Terminado o trabalho, seguem todos os links.
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Ao invés de me meter a analisar toda a obra, me recolho à minha insignificância e me junto a toda uma população brasileira sem memória. Não sabia que Simonal foi em todos os sentidos o maior cantor desse país. Só mesmo uma caixa dessas e o filme "Simonal - Ninguém sabe o duro que dei" para colocar em perspectiva o que sua incrível trajetória representa para a música brasileira. Ascenção e queda, como nos melhores contos de heróis, a carreira dele é tão absurdamente brilhante em seu topo e tão fundo-do-poço no ostracismo pós 71 que ter sua fase de glória relançada e remasterizada é mais do que merecido. É necessário para nos dar um pouco da tal memória perdida. Necessário lembrar que nem sempre música (extremamente) popular é de mau gosto. Que arranjos sofisticados não só se enquadram no jazz ou na elitista MPB. É só acompanhar os brilhantes arranjos dos maestros Lyro Panicalli, Erlon Chaves, Eumir Deodato e Cesar Camargo Mariano, esse último atuando também como pianista do Som Três (ao lado de Sabá e Toninho Pinheiro), trio que acompanhou Simonal em mais da metade desta discografia. Sofisticação a serviço da boa música, que chegou num ponto (a chamada "pilantragem") que flertava com músicas folclóricas, dando um ar popularesco à sua música, porém sempre em arranjos certeiros e um swing irresistível. E a voz... que voz!! Não é só uma aula, é uma humilhação à toda uma geração de pretensos cantores de música popular brasileira. Se tudo isso não fosse suficiente, a gama de compositores gravados por Simonal dá uma ideia de sua versatilidade e bom gosto no repertório: Carlos Lyra, Tom Jobim, Vinicius, Antonio Adolfo, Edu Lobo, Jorge Ben, Silvio César, Marcos Valle, Gil e Caetano (engatinhando como compositores), Chico Buarque, além da marca pessoal de Carlos Imperial, um dos arquitetos da "pilantragem".

É o tipo de artista que dá pra dizer sem medo: leia o livro, veja o filme, e ouça cada disco. Depois tente pensar se já houve cantor maior que Simonal. Não há!

(Clique em cada capa para um link diferente. Boa música para as pessoas de bem!)


















segunda-feira, 17 de janeiro de 2011

Unfinished Music No.2: Life With The Lions [1969]

O novo lançamento da Zapple Records saiu apenas 7 dias após o Electronic Sounds de Harrison. O título é uma referência ao famoso programa da rádio britânica (Life with the Lyons) que John Lennon costumava ouvir com seu tio George, quando garoto em Liverpool. Claro que a mudança de uma letra continha um ácido comentário sobre a rejeição geral que sua nova parceira musical sofria na pele em relação aos outros Beatles, e em todo o lugar onde passava. A foto da contra-capa é peculiarmente ilustrativa, mostrando o momento em que uma "fã" arranca um fio de cabelo de Yoko, num momento já difícil - o casal estava sendo levado à delegacia, acusados de porte de maconha (incidente que perseguiria-os por muitos anos a frente em Manhattan). Sentindo-se o próprio "Daniel na cova dos Leões", a capa mostra outro momento difícil, quando Ono perdeu o que seria o primeiro filho do casal (John Ono Lennon II, acredite), e o pobre MBE teve sua cama levada após um dia em que estava ao lado da paciente. "No Bed for Beatle John", a peça, é exatamente sobre isso.

Enquanto Two Virgins era espontâneo em sua experimentação com gravadores em um mesmo espaço, como uma espécie de suíte durando uma noitada regada a drogas, o No. 2 da série é feito de faixas sem aparente relação umas com as outras. O resultado é mais cerebral ou, se preferir, mais chato. Há algum grau de interesse na longa faixa que toma todo o lado 1, "Cambridge 1969", primeiro por ser uma gravação ao vivo, uma das primeiras performances do casal, em março daquele ano. Descontada a gritaria interminável, o trabalho de microfonia da guitarra de John é bastante interessante, especialmente quando o baterista John Stevens responde com os pratos (e a essa altura já estamos beirando os 20min dos mais de 26...). Os universitários de Cambridge não acreditaram que um Beatle pudesse fazer uma performance tão avant-garde, já os que conheciam Ono como artista plástica não devem ter se espantado tanto... Lá pro fim da peça podemos ouvir John Tchicai no saxofone soprano, o que contribui para o clima free-jazz, mas insisto que os berros de Yoko infelizmente tomam demais as atenções do que poderia ser uma grande jam session.
O lado 2 do vinil original foi gravado em fita ainda em 1968, exatamente durante a estadia do casal no hospital Queen Charlotte. A citada "No Bed for Beatle John" é Yoko a capella, em uma melodia de sabor oriental (japonesa, imagino). Ao mesmo tempo pode-se argumentar que seu canto (e o contracanto de John, ao fundo) lembram o Canto Gregoriano dos monges da Idade Média. Isso dá o que pensar sobre o paradigma Ocidente X Oriente, mas vou deixar a brecha para outro post... "Baby's Heartbeat" é o rebento ainda com vida intra-uterina, num tipo de gravação que seria imitado por Max Cavalera no disco Chaos A.D. do Sepultura. Pelo menos Max foi mais sensato, e usou os batimentos cardíacos do filho como introdução do disco, apenas. "Two Minutes Silence" é exatamente isso. Hoje em dia é fácil "desprogramar" a faixa, mas pensemos no disco de vinil. Lá no meio do lado 2 você é obrigado a "ouvir" 2 minutos de silêncio. A ideia deve muito a John Cage, claro, mas devemos lembrar que o casal perdeu o bebê, então a faixa serve como um luto, interrompendo os batimentos cardíacos que martelam por 05 min. Fechando a bolacha, "Radio Play". Parece que Joko Nono & Cia. estavam mesmo dispostos a imprimir uma estética Cageana à sua produção alternativa. Só que diferente das experiências com rádio do outro John, o casal limitado a um quarto de hospital, gravou o som do dial do rádio indo pra frente e para trás, enquanto podemos ouvir Lennon ao telefone, conversas triviais, aquela coisa doméstica. A faixa dura 12 min (...).
Por fim, temos os bonus tracks incluídos na versão em CD. "Song for John" é outra balada folk, assim como "Remember Love", bônus em Two Virgins. "Mulberry" traz como novidade o que parece ser um dobro, tocado com slide por Lennon. E os vocalizes de Yoko são menos agressivos, provavelmente devido a seu estado de saúde. Ela bem que podia ter estado mais doente durante outras sessões dos dois.. Brincadeiras à parte, melhor citar o sábio George Martin: "No Comment"!

Aqui (.mp3, 192 kbps).