quinta-feira, 31 de dezembro de 2009

The BEATLES [White Album Mono Mix]



Em 22 de novembro de 1968 o mundo conheceu uma obra sem precendentes. Avant Garde sem deixar de ser rock; aliás um dos discos mais rock que se há notícia. Porém fragmentária, encontrando soluções inteligentes a serviço do exagero quantitativo, com faixas pouco conectadas estilisticamente umas com as outras (o que ocorre ocasionalmente também), seus 04 lados dando uma progressiva cara a um álbum que só pode ser realmente entendido e apreciado dentro da completude de suas 33 músicas! O caráter individual do Álbum Branco não se restringe ao modus operandis dos 04 compositores-músicos e agora homens de negócio. Era definitivamente uma nova fase pós-retiro na Índia, perda de Epstein, divórcios, casamentos e, da parte de John, heroína e Yoko. A busca por paz interior em Rishikesh teve como efeito para os Beatles, além da quantidade enorme de novas músicas, a preparação para mais um vôo na carreira: assumir a reponsabilidade de gerir a Apple Music e cuidar de um negócio pra lá de atribulado, enquanto continua-se a produzir boa música. Pelo menos nesse quesito, ainda que muita gente torça o nariz para uma ou outra extravagância, a maturidade e capacidade de produzir diversas sonoridades soando sempre Beatles e impecável em todas elas é suficiente para atestar o álbum como superior a qualquer outro lançado até então, ainda que outros clássicos anteriores e o Abbey Road sejam mais 'favoritos' em listas como tais. Pessoalmente acho cada novo disco produzido pelos Beatles uma evolução em relação ao anterior, com exceção de Let it Be, gravado imediatamente após o lançamento de The BEATLES, que tinha a idéia geral de ser um projeto revisionista e não apontando pro futuro. E o futuro é aqui. Um disco (digo, dois) verdadeiramente transcendental.

1-01 - Back In The U.S.S.R. (Lennon/ McCartney)
1-02 - Dear Prudence (Lennon/ McCartney)
1-03 - Glass Onion (Lennon/ McCartney)
1-04 - Ob-La-Di Ob-La-Da (Lennon/ McCartney)
1-05 - Wild Honey Pie (Lennon/ McCartney)
1-06 - The Continuing Story Of Bungalow Bill (Lennon/ McCartney)
1-07 - While My Guitar Gently Weeps (Harrison)
1-08 - Happiness Is A Warm Gun (Lennon/ McCartney)

Ringo não aparece nas duas primeiras faixas, sinal dos tempos. Sua saída da banda, ainda que por pouco tempo, foi o começo da sensação geral de que se estava começando o fim. Mas como terminar com uma banda que é parte de como uma pessoa se vê agindo no mundo, em toda sua vida adulta? A neurose dos Beatles em registrar tanto material novo é descrito por Harrison como o ego de seus integrantes vindo à tona, com sessões muitas vezes tensas e diferente dos "velhos tempos" onde 'os cinco', banda e produtor eram um grupo coeso de trabalho, assistido apenas por um engenheiro de som ou algum assistente da banda. A fórmula para essas gravações que cobriram longos 05 meses era não esperar por ninguém, e muitas vezes não contar mesmo com o outro. Paul já havia sido baterista em uma gig logo antes de irem para Hamburgo no começo de carreira. Na faixa de abertura, de inspiração beachboyniana ele faz o básico, mas certamente o que ele apronta em "Dear Prudence" estava à altura das inovações de Ringo. A música de John é marcada pela afinação da corda 'Mizona' do violão (a mais grave) um tom mais baixo (ou seja, Re), e um peculiar dedilhado que Lennon havia aprendido na Índia com Donovan. Depois da ótima "Glass Onion" - "the walrus was Paul" sendo a melhor das várias sacadas na letra - o reggae é o ponto de partida para uma faixa quase infantil. Para Paul, "Ob-La-Di Ob-La-Da" seria o próximo single. Alguma dúvida de que iria vender como água? As estranhezas dão o primeiro sinal de vida numa vinheta produzida por McCartney sozinho. Nada muito sério. John apresenta Yoko ao mundo fonográfico em "Bungalow Bill", liderando uma brincadeira alegre em tons melancólicos (ouça o tema tocado no melotron ao final da faixa). Os vocais de Ringo no refrão, junto à sua então esposa Maureen, mais John&Yoko são o ponto alto. Simplicidade em meio à bagunça. E antes que o ouvinte se recupere do susto que é "While My Guitar..." - e o solo de um coringa, frequentemente referido como "Deus" (se bem que pra mim 'deus' é Hendrix), John faz mais um gol de placa: "Happiness is a warm gun" parece ser a música favorita tanto de Paul como de George nesse disco. Uma 'ajuntamento' de três canções distintas, "I Need a Fix" pode ser conferida no Anthology 3 na versão demo caseira. O que se tornou a master começa com um riff hipnótico que introduz versos psicodélicos. Em seguida uma guitarra saturada introduz outro riff desta vez pesadão, num 6/8 que desemboca num ajustamento livre da métrica que pode ter influenciado caras como Syd Barrett e algumas músicas de seu Pink Floyd. Por fim, o título, uma manchete de uma matéria numa revista trazida ao estúdio por George Martin, com o clássico "Bang Bang, Shoot Shoot". Que golaço!

1-09 - Martha My Dear (Lennon/ McCartney)
1-10 - I'm So Tired (Lennon/ McCartney)
1-11 - Blackbird (Lennon/ McCartney)
1-12 - Piggies (Harrison)
1-13 - Rocky Raccoon (Lennon/ McCartney)
1-14 - Don't Pass Me By (Starkey)
1-15 - Why Don't We Do It In The Road (Lennon/ McCartney)
1-16 - I Will (Lennon/ McCartney)
1-17 - Julia (Lennon/ McCartney)

O lado 2 do disco é o que mais se parece com uma coleção de esforços individuais, e o que também deixa claro a inspiração minimalista das composições nascidas no esquema voz-violão. Minimalismo este que desembocaria no conceito geral da capa branca e título do disco. "Martha My Dear" começou como um estudo de piano para Paul McCartney e virou uma de suas canções mais líricas. "I'm So Tired" é outra de John que revisita a sonoridade 'banda', como em "Happiness...", enquanto que "Blackbird" é novamente Paul on his own banquinho-e-violão. É a segunda diferença significativa da mix Mono em relação à Estéreo (a primeira sendo a intro de "Ob-La-Di..."): o canto dos pássaros-negros aparece aqui em momentos distintos, e soam diferente mesmo. "Piggies" é um comentário social de George Harrison sobre a classe média no Reino Unido, e sua mãe contribuiu com o verso "all they need is a damn good wacking"! "Rocky" é o personagem principal de uma estorinha estilo "faroeste" de Paul, com intervenções interessantes de gaita e harmônio (Lennon), baixo com pedal (Harrison) e piano honky-tonk (George Martin). Em "Don't Pass Me By" acontece o mesmo que "She's Leaving Home": a rotação é alterada para cima, deixando a música 'mais alegrinha'. Esse country de Ringo já vinha sendo composta há alguns anos, e no final da música ouve-se a 'rabeca' (violino) de Jack Fallon numa versão completamente diferente do que se conhecia na stereo mix. "Why Don't We.." também omite algumas palmas na introdução, e o lado 2 do disco 1 fecha magistralmente com duas baladas: "I Will" e "Julia", ambas canções que, assim como "Good Night", embalaram muitas noites de sono de minha pequena Julia.

1-18 - Hey Jude (Lennon/ McCartney)
2-01 - Revolution (Lennon/ McCartney)

Em 30 de agosto, a Apple era sacramentada com seu primeiro lançamento, mais um compacto a mudar as regras fixas do mercado fonográfico. Uma música de trabalho de mais de 7 min não era algo pensável, mas sendo agora donos do próprio nariz, os Beatles mais do que nunca jogavam as cartas do próprio jogo. Mr. Ballad Man, Paul McCartney, compôs "Hey Jude" enquanto estava a caminho da casa de John, que não estava mais lá, mas sim Cynthia Lennon e seu filho Julian. A letra, mais do que Paul consolando o garoto, é um recado direto a seu pai, especialmente no verso "go out and get her". Ao seguir "Julia" com "Hey Jude", põe-se em perspectiva seus temas como se estivessem relacionados: a falecida mãe de John, Yoko ("ocean child") e Julian... O longo final da música soa como um canto ritualístico, um mantra pop. Ou nada disso, apenas mais uma maneira de se fazer uma canção perfeita. O lado B aqui abre 'meu' segundo Cd, e assim temos as três encarnações de "Revolution" num mesmo disco. E as guitarras estridentes dessa versão é uma ótima introdução ao lado 3 do Álbum Branco...

2-02 - Birthday (Lennon/ McCartney)
2-03 - Yer Blues (Lennon/ McCartney)
2-04 - Mother Nature's Son (Lennon/ McCartney)
2-05 - Everybody's Got Something To Hide Except Me And My Monkey (Lennon/ McCartney)
2-06 - Sexy Sadie (Lennon/ McCartney)
2-07 - Helter Skelter (Lennon/ McCartney)
2-08 - Long Long Long (Harrison)

"Birthday" continua o clima "jam session" que se estende até "Yer Blues", no pedaço de vinil mais pesado e cru de qualquer álbum dos Beatles. Remasterizados, o blues e todas as faixas que a banda toca junto ganharam um brilho em sua sonoridade jamais ouvida anteriormente. Eu sempre achei que o problema era porque as gravações ao vivo não poderiam ter a mesma qualidade das gravadas em separado. Mas ao que parece a pós-produção fez toda a diferença! E antes de mais um rockão, Paul mais uma vez acompanhado só de músicos de estúdio (trompas) nos leva ao bucólico mundo de Rishikesh em "Mother Nature's Son". A irmã-gêmea "Child of Nature" de John só viria a ser resolvida como "Jealous Guy" três anos depois... "Everybody's..." é de minhas prediletas. Groove matador de baixo, guitarras no talo, riff certeiro e um sinal de alarme de incêndio que deu um charme especial, além de gritinhos e falatório ao final. John continua a ter o Maharishi em mente na próxima composição. "Sexy Sadie" de alfinetada acabou virando uma grande música, com vocais que remetem à terceira parte de "Happiness..." e órgão e piano (John e Paul) bastante entrosados. O trabalho de contrabaixo de Paul também é destaque (como sempre). Mas o auge estava apenas com seu terreno assentado. "Helter Skelter" foi parido numa sessão que desembocou numa festinha no estúdio, com os Beatles em jams insanas e Harrison atiçando fogo a um cinzeiro, correndo de um lado ao outro com o mesmo em sua cabeça! Um bom retrato para a sonoridade caótica, que inclui vários sons esquisitos, como intervenções de saxofone de John, algo como um patinho de borracha (seguido por riso de Paul) e claro, o sensacional noise de guitarra que começa o trecho final da mono mix de maneira completamente alternativa à versão em estéreo, sem retorno triunfal e os calos nos dedos de Ringo. Após a tempestade, a calmaria chega com "Long Long Long", que tem vocais finalmente desenterrados das profundezas da mix e realçadas na remasterização. A bateria continua alta e marcante e o final é marcado pelo som do shehnai, mais uma novidade trazida da Índia. O órgão Hammond é tocado por Paul.

2-09 - Revolution 1 (Lennon/ McCartney)
2-10 - Honey Pie (Lennon/ McCartney)
2-11 - Savoy Truffle (Harrison)
2-12 - Cry Baby Cry (Lennon/ McCartney)
2-13 - Revolution #9 (Lennon/ McCartney)
2-14 - Good Night (Lennon/ McCartney)

Como o nome indica, a versão lenta de "Revolution" foi a primeira das três a serem trabalhadas (e também a primeira das sessões começadas em Maio - opa, lembremos que estamos em 1968!!), e serviu de base para a colagem sonora do 'sonho 9' de Lennon. Os metais são uma boa introdução à sonoridade vaudeville, ou música-de-cabaré que Paul conseguiu para "Honey Pie". Anos 20 total. Saxofones marcam "Savoy Truffle" de George, que manda um órgão matador, além de um solo de guitarra à altura do que ele não fez em "While My Guitar...". Aliás é o mesmo Eric Clapton a fonte de inspiração para todos os sabores de trufas descritas na letra. Precisa falar do baixo? "Cry Baby Cry" foi descrita por Lennon como "porcaria", e guardadas as devidas proporções e radicalismo do pai da criança, eu concordaria que não é das melhores em todo o álbum. Ainda assim, não faz feio dentro do conjunto da obra, e a vinheta só agora creditada no encartes da versão digipack "Can You Take Me Back" forma uma ponte perfeita para "Revolution #9". Muito já foi dito dessa não-música, mas longe de procurar explicações que possam justificar a inclusão de 8 min de experimentalismo vanguardista, é preciso filosofar acerca da importância desse marco da música popular contemporânea. Não é à toa que 09 de setembro (09) de 2009 foi a data escolhida para lançamento da obra completa do quarteto em seus dois formatos. O que aconteceu com essa faixa foi algo que ocorre com o distanciamento que só o tempo pode proporcionar. A perspectiva histórica nos ensina que obras-de-arte não precisam de explicação, mas elas explicam-se por si mesmas. Mas minha leitura é de que "Revolution #9" é tão fundamental para o Álbum Branco como qualquer outra de suas faixas. Com o adendo de que sendo uma não-canção, ela funciona como um manifesto. O verdadeiro modernismo (ou pós-modernismo, sei lá) esboçado na colagem de fotos disposta no pôster tem como acompanhamento a trilha sonora do fim do mundo, pelo menos do jeito que o conhecíamos. É um comentário definitivo e definidor do que poderia ser uma revolução, não mais com uma letra esperta, mas sonoramente desafiador, com o tipo de manipulação de fitas que Paul fazia já algum tempo, mas que John precisou do apoio de George (e Yoko onipresente) para dar vida. Um epitáfio: "Good Night" é descrita por Paul como um dos momentos de mais ternura por parte de John, e seria uma dádiva se alguma versão com ele fazendo voz guia aparecesse em alguma compilação piratex ou não... Mas Ringo não faz feio (mesmo) e George Martin cria com seu arranjo um belo clima hollywoodiano. E assim se encerra um clássico. Com o caos solto no mundo externo e interno dos Beatles, só nos resta embalar as crianças para dormir e esperar que tudo saia bem no fim-de-tudo.

Total Time:
Disc 1 - 53:34
Disc 2 - 50:43

Download links (.flac):
Disc 1 - Part 1
Disc 1 - Part 2
Disc 2 - Part 1
Disc 2 - Part 2

segunda-feira, 21 de dezembro de 2009

Magical Mystery Tour [Mono Mix]



01 - All You Need Is Love (Lennon/ McCartney)
02 - Baby, You're A Rich Man (Lennon/ McCartney)

Não havia se passado nem um mês do lançamento de Sgt. Pepper's e os Beatles já estavam em estúdio novamente, desta vez para uma gravação que seria transmitida via-salétite (wow!) ao vivo para todo mundo. Our World era o nome do projeto televisivo, parte do festival canadense Expo 67. A transmissão foi em 25 de junho, e o compacto sairia no dia 07 de julho! O que se ouve na gravação não é exatamente o que foi executado ao vivo. O banda já havia criado uma basic track mais cedo, e ao que parece o que tava valendo ao vivo era a orquestra e os vocais. Há ainda uma estória que eu não saberia confirmar (e não lembro onde li) que a versão do compacto original é diferente da versão que encerraria o Lp Magical Mystery Tour e dois anos depois o Lado 1 de Yellow Submarine. Mas só quem tem esse 45rpm histórico poderá confirmar alguma diferença... A música cita clássicos da canção popular ("Greensleaves", "In the Mood", "She Loves You"), faz um uso descarado do hino da França em sua introdução, e tem uma fórmula de compasso pouco convencional em suas estrofes. Já mencionei que John Lennon gostava da brincadeira, e aqui ele contrói suas estrofes (de belos versos) num 7/4. O Lado B do single trazia "Baby, You're a Rich Man" que é mais uma junção de duas músicas distintas, como foi "A Day in the Life" e como seria "Happiness is a Warm Gun". Destaque para o excelente trabalho contrabaixístico de McCartney (palheta e notas abafadas).

03 - Hello Goodbye (Lennon/ McCartney)
04 - Only A Northern Song (Harrison)

E aqui começa(?!) minha licença poética para mais essa compilação em Mono. "Hello Goodbye" foi lançada em compacto no dia 24 de novembro, mas o seu lado B era "I am the Walrus", que sairia pouco depois no... ah, você já sabe. Fica a deixa para usar a imaginação: por que "Only a Northern Song" - uma genuína sobra de estúdio de Sgt. Pepper's - não foi aproveitada como lado B nestes dois compactos de 1967? Levanto algumas hipóteses: a) "I am the Walrus" era boa e revolucionária o suficiente para sair tanto no disquinho de 7'' quanto em MMT; b) o ego de John falou mais alto: o lado A é de Paul; c) "Only a Northern Song" poderia não estar considerada concluída... é uma gravação deveras experimental. Há de se lembrar também que Harrison só viria a emplacar pela primeira vez uma composição sua num compacto dos Beatles em 1968 (ver "Lady Madonna" logo abaixo). Mas aqui sua música é estranha (porém magnífica) o suficiente para contrabalancear a perfeição pop de "Hello Goodbye", e seu riff baseado na escala diatônica. E quer lugar melhor para se dizer que "isso é apenas uma canção da Northern" (empresa que gerenciava os direitos das músicas de Lennon/ McCartney) do que o lado B de um mega-hit? Detalhe histórico: nunca existiu uma mix estéreo de "Only a NS", o que se ouvia nos antigos Lps e Cds Yellow Submarine era um chamado fake stereo. O cd remasterizado em caixinha digipack apresenta essa mesma mix mono.





















05 - Magical Mystery Tour (Lennon/ McCartney)
06 - Your Mother Should Know (Lennon/ McCartney)
07 - I Am The Walrus (Lennon/ McCartney)
08 - The Fool On The Hill (Lennon/ McCartney)
09 - Flying (Lennon/ McCartney/ Harrison/ Starkey)
10 - Blue Jay Way (Harrison)

A trilha sonora para o novo filme dos Beatles (e primeiro projeto após a morte do empresário Brian Epstein) saiu pela Parlophone (UK) em 08 de dezembro num formato inusitado: dois compactos extendidos cada um com duas faixas no Lado A e uma no Lado B. Cheguei a manusear a belíssima versão nacional, original da época, num sêbo em São Paulo, mas infelizmente não tive condições de adquiri-lo. Mesmo sendo no formato compacto, o disco trazia o generoso libreto, esse ano reeditado nos Cds remasterizados, tanto Estéreo quanto o Mono. A diferença sendo, o que foi estabelecido como o Magical Mystery Tour da discografia dos Beatles é o Lp lançado pela Capitol nos EUA em novembro de 1967, disco que só sairia no Reino Unido em 1976(!). São essas mesmas faixas redistribuídas para um lado maior de Lp, e o lado B compilando três compactos (já comentados) do mesmo ano. E o filme pode até ser um saco (principalmente se você o assistir sem legenda), mas a música dos caras não caía de nível. Aliás o experimentalismo dos Beatles em estúdio atinge o ponto culminante aqui. Daí para frente eles buscariam uma volta a uma sonoridade mais básica. Os trompetes dão o tom na faixa-título, que tem um final extendido para uma jam session quase jazz. "Your Mother Should Know" é da mesma safra de "Good Day Sunshine" e "When I'm Sixty Four". É o fascínio de Paul pelos discos que o velho Jim McCartney ouvia em casa. Já em "I Am The Walrus" não há nada que possa se chamar de convencional.

O melotron tocado por John já tem um som um tanto sinistro. O arranjo de cordas capricha nos graves criando um clima soturno. A bateria entra seca, lembrando que isso é uma banda de rock, apesar da ausência de guitarras. A letra é o grande trunfo, uma continuação para o que Lennon havia lançado em livro (foram 02), inspirado por Lewis Carroll em suas justaposições de palavras sem qualquer relação aparente e livres associações de sentido, numa preocupação formal surrealista na criação de imagens. Poesia pura. Para completar o arranjo, John plugou um rádio à mesa de som, e na gravação ouve-se várias dessas inserções. Fora o côro bizarro, uma ótima maneira de se encerrar um lado de um disco (seja ele o lado B do compacto ou lado 1 do Lp).

"The Fool On The Hill" abria o segundo disquinho de maneira singela. É impossível não se derreter com a beleza dessa canção. Paul gravou as flautas, e aparece no filme sozinho, como o fool himself. Mas diferente de "Yesterday" ou "Eleanor Rigby", todos os outros Beatles colaboraram nessa gravação antológica. Encerrando o Lado A, a única música creditada aos Fab Four, e segundo registro instrumental do grupo (a outra sendo "Cry For a Shadow", disponível no Anthology 1). Como trilha do filme, funciona. Mas interessante mesmo é a contribuição de George para a trilha. "Blue Jay Way" é um lugar que ele havia se hospedado em Los Angeles. A letra fala na verdade do dia em que Derek Taylor, futuro assessor de imprensa da Apple, se perdeu numa neblina tentando achar o tal lugar. George-o-compositor escancara um órgão hammond, a bateria de Ringo é quase tribal, e um violoncelo é a cereja do bolo, que inclui ainda alguns efeitos eletrônicos (Harrison lançaria em dois anos o disco Electronic Sound aprofundando-se no assunto)...

11 - Lady Madonna (Lennon/ McCartney)
12 - The Inner Light (Harrison)

Já era 1968 e as sessões de fevereiro produziriam o 17º compacto (o último a sair pela Parlophone), lançado em 15 de março, além de mais algumas canções que seriam aproveitadas para a trilha da animação Yellow Submarine. Em "Lady Madonna" temos Paul dando uma de Fats Domino no piano, e um solo de sax altamente rock 'n' roll (para não perder o costume, os Stones fariam o mesmo um ano depois em "Live With Me"). Já o lado B teve a parte instrumental colhida na Índia em janeiro, durante as gravações do primeiro disco solo de um beatle: Wonderwall Music. George gravaria o vocal com algumas intervenções ao final de John e Paul um mês depois em Abbey Road. É a última da séria série George-o-indiano. E das mais belas, sem o clima pesadão das outras duas. Vale a pena conferir a versão do Concert for George.

13 - All Together Now (Lennon/ McCartney)
14 - Hey Bulldog (Lennon/ McCartney)
15 - It's All Too Much (Harrison)

Não existe o disco Yellow Submarine na caixa Mono. Essas três faixas, mais "Only a Northern Song" estão disponíveis como parte das Mono Masters. O detalhe é que é a primeira vez que essas mixes em mono são lançadas comercialmente, a trilha só saiu em janeiro de 1969, quando o Estéreo já havia se consolidado. Mas o filme estreou nos cinemas ainda em 68, e os Beatles já tinham essas músicas na manga antes mesmo de entrar em estúdio para gravar o Álbum Branco. "All Together Now" tem o poder de encantar crianças, minha filha que o diga; "Hey Bulldog" tem um dos melhores refrões da carreira de Lennon (numa progressão de acordes que ele voltaria a explorar); e "It's All Too Much" encerra esse disquinho como a quarta composição de Harrison (só o duplo álbum branco conseguiria tal feito), assim como ela encerra o excelente filme (ok, antes da reprise de "All Together Now") e também a Songtrack. A lisergia do arranjo e final extendido remetem à trilha do filme anterior. No fim das contas, apesar da assumida forçação, essas músicas não soam tão deslocadas assim do resto do material acima. É importante lembrar que no Yellow Submarine a música que seguiria é "All You Need Is Love". Tá vendo, nothing is real...

Total Time:
49:58

Download links (.flac):
Part 1
Part 2

sexta-feira, 18 de dezembro de 2009

Sgt. Pepper's Lonely Hearts Club Band [Mono Mix]























01 - Strawberry Fields Forever (Lennon/ McCartney)
02 - Penny Lane (Lennon/ McCartney)

Em 17 de fevereiro de 1967, o novo compacto duplo dos Beatles, mostrava uma nova persona. Lennon se referia a 'eles' como os "clever Beatles". Não fazer mais shows trouxe uma dramática mudança na concepção de banda. E isso se refletiu logo nessas duas faixas, que poderiam ter sido parte de um novo álbum, porém eventualmente elas sairiam no fim daquele ano no LP da Capitol Magical Mystery Tour. Aqui, esse humilde compilador faz exatamente como na coletânea azulzinha (1967-1970), que põe essas duas obras-primas onde deveriam estar - o Lado 1 daquele disco indo como está aqui até "Lucy", e concluindo com "A Day in the Life". O que é um tracklist natural, pois "Strawberry Fields" foi a primeira faixa a ser trabalhada naquelas longas sessões. O que mais gosto nela (e há várias coisas que me tiram do sério em "Strawberry Fields") é a voz de John desacelerada. É muito legal reconhecer o timbre de um mesmo vocalista numa região mais grave, atípica pros Beatles. Essa desaceleração da fita é fundamental pro clima soturno da gravação; os pratos (entre outras coisas) ao contrário, a genial performance de Ringo na bateria e overdubs e todo arranjo de George Martin contribuem para tudo funcionar sem tirar nem botar. A versão mono traz um diferente fade no final... "Penny Lane" é o contraponto ideal: após a visita aos campos de morango com um olhar dark, hora de fazer um picnic ao som de melodias assobiáveis, inspirados pelos Beach Boys. Perfeição perde.























Diz-se que tanto George Martin como John Lennon já foram citados comentando algo como "se você não ouviu Pepper em Mono, você não ouviu Pepper". Um certo exagero, talvez, mas é indiscutível que a experiência é outra. Melhor ou pior é irrelevante, mas qualquer fã sério dos Beatles deveria pelo menos ouvir alguns desses discos em sua versão Mono. E "Sgt. Pepper's" é ponto alto. Lançado em 1º de junho, 04 meses após aquele compacto inicial, o disco é uma busca honesta por um som original, arranjos e concepções que nunca haviam sido explorados anteriormente. E o resultado é 'satisfação garantida'. Da rasgação da faixa-título à catarse de "A Day In The Life" são vários os motivos para se incensar um disco que, à primeira ouvida, pode não parecer mesmo grande coisa (explico: no fundo, é só mais um ótimo disco dos Beatles). Mas a fórmula é simples de entender: pegue os Beatles saídos de Revolver (e "Tomorrow Never Knows"), com a emergente cultura flower power, adicione os escritores da contracultura que incluiam os beatniks Kerouac e Ginsberg, uma pitada de aditivos alteradores de consciência, não esqueça de praticar sua meditação transcendental ao som de música indiana, e tenha George Martin como produtor responsável. Para embalar pra venda, e não virar um item cult deixe tudo bem pop: uma capa que realmente chame atenção, cores berrantes e um conceito - vazio, claro. Mas forte o suficiente para as pessoas acreditarem que se trata de um álbum sobre um mesmo tema.


















03 - Sgt. Pepper's Lonely Hearts Club Band (Lennon/ McCartney)
04 - With a Little Help From My Friends (Lennon/ McCartney)
05 - Lucy In The Sky With Diamonds (Lennon/ McCartney)
06 - Getting Better (Lennon/ McCartney)
07 - Fixing a Hole (Lennon/ McCartney)
08 - She's Leaving Home (Lennon/ McCartney)
09 - Being For The Benefit of Mr. Kite! (Lennon/ McCartney)

O que faz um bom disco? As músicas! E o que faz boas músicas? Os músicos! Pegue o exemplo da Motown. Anos e anos se falando da mágica no "som da Motown", e há pouco tempo saiu um Dvd apresentando a banda (quase nunca creditada nos discos) que esculpiu aquele som, os Funk Brothers - todos músicos de jazz, arranjadores incríveis. Moral da história: sem Lennon, McCartney, Harrison, Starr ou Martin não haveria Pepper. Que como ideia, surgiu numa viagem de trem... Paul foi o grande catalisador de ideias e responsável por motivar o grupo a sempre pensar à frente e não se acomodar. Em "Sgt. Pepper's..." ele é o mestre-de-cerimônias e o que se ouve são guitarras no talo, um cartão-de-visita de um real disco de rock. Já em "Little Help" o minimalismo do arranjo dá a tônica para Ringo cantar à vontade. "Lucy" é bastante lisérgica - essa mix me pareceu ter uma dose maior de phaser, na voz e bateria... E o baixo de Paul comanda, além do órgão Hammond também tocado por ele. O ponto forte é a letra, num estilo surrealista que John levaria ao extremo em "I Am The Walrus" ainda naquele ano. São basicamente canções de Paul as próximas três faixas: "Getting Better" tem uma sacada genial na bateria, e a tambura indiana de George Harrison; em "Fixing a Hole" ouve-se um cravo (George Martin), e os timbres de guitarra ajudam no clima psicodélico. Já "She's Leaving Home" abre com um som de harpa (quer instrumento mais angelical?), num arranjo bacana de Mike Leander para cordas (George Martin até hoje se ressente do fato). Ah, já ia esquecendo: essa música roda mais 'rápida' na versão mono. A voz é mais aguda, e o andamento é levemente alterado 'pra cima'. O lado 1 fecha como um colorido carrossel, com Lennon contando em detalhes todas as atrações observadas em um cartaz de circo, para uma performance do Mr. Kite! Muito bom o loop criado por George Martin que traz a sensação de "música de circo", em compasso 6/8 (o resto da música é quaternário). Esse processo de gravação elaborado por Martin - o bouncing down de trilhas de 04 canais para apenas uma, assim tendo sempre mais trilhas disponíveis para mais gravações foi revolucionária e inspirou dezenas de engenheiros, músicos, produtores (detalhe: já se usava o sistema de 08 canais nos EUA nessa época). E mesmo com os modernos estúdios e mesas de hoje em dia há bandas que - talvez em busca da 'mágica' - utilizam o mesmo recurso que George e os Beatles fizeram em 1967. Exemplo: ouça o disco Black Foliage do Olivia Tremor Control. Quatro canais e muita experimentação...

10 - Within You Without You (Harrison)
11 - When I'm Sixty-Four (Lennon/ McCartney)
12 - Lovely Rita (Lennon/ McCartney)
13 - Good Morning Good Morning (Lennon/ McCartney)
14 - Sgt. Pepper's Reprise (Lennon/ McCartney)
15 - A Day In The Life (Lennon/ McCartney)

Estávamos conversando... sobre como "Within You Without You" é música indiana seriamente composta por Harrison e executada por músicos de lá. Alguns dos instrumentos usados: dilruba, tabla, swarmandal e tamburas (uma delas tocada pelo eterno roadie Neil Aspinall). É perceptível - fora a instrumentação -, o quanto é complexa a música indiana. Os compassos não seguem uma quadratura identificável, onde se espera uma continuação ou resolução. Os ragas, como chamados os temas que podem ser desenvolvidos por horas de improvisação coletiva, seguem estruturas não-lineares, ou seja, as mudanças de fórmula de compasso são constante, muito do fundamento do raga se dá nessa 'quebra' da sensação retilínea do tempo... ao mesmo tempo que uma mesma nota fundamental dá uma sensação de eterno retorno, de tempo suspenso. E como bom Beatle, George conseguiu unir toda essa complexidade na estrutura dessa música, sem fugir do senso de canção que consagrou seu grupo. A melodia é simples, porém forte e a letra resume tudo que se possa elocubrar sobre uma canção como essa: "if they only knew!".

Depois de boas risadas (de novo: esse final na versão mono é bem diferente) mais uma vez Paul quebra o climão e deixa tudo light: "When I'm Sixty Four" é uma delícia e foi uma das primeiras músicas a serem trabalhadas nas sessões iniciais, junto ao compacto lá de cima. Os clarinetes (e clarinetes-baixo) comandam a festa. Frank Zappa acusou os Beatles de terem surrupiado alguma de suas idéias avançadas em Freak Out para o final de "Lovely Rita", o que de fato faz sentido. Em retorno, Zappa faria isso. Mas voltando à "Rita", o experimentalismo não é só no final: o som de 'chocalhos' é na verdade pente e papel. O solo honky-tonky é de George Martin mas ao final ouve-se McCartney ao piano. Sounds Incorporated é um grupo de Liverpool formado por três saxofones, dois trombones e uma trompa (seriam eles os Lonely Hearts Club Band?). É essa galera que segue o canto do galo em "Good Morning". A história do comercial da Kellog's todo mundo conhece, mas o que não se fala muito é de como Lennon gostava de mexer na estrutura das músicas. Essa é bem peculiar, misturando compassos 5/4 - bem incomuns no pop, com o tradicional 4/4 que acompanha o corinho ("Good Morning, Good Morning"). O final então é uma zona. Muito bom! A "Reprise" cumpre seu papel sem muita enrolação, com melodia agora nas três vozes. Mas o melhor estava guardado para o final...
























"A Day In The Life" é uma das principais músicas do séc. XX. Tá tudo lá. O melhor de Lennon, de McCartney e dos Beatles - o bongô tocado por Harrison faz bastante diferença, e a bateria de Ringo é citada por 09 entre 10 bateristas como uma das coisas mais instigantes que eles já ouviram. De George Martin, temos um bom exemplo de como o rock se apropriou do som de uma orquestra chegando ao ápice de usá-lo como efeito sonoro, e não apenas num arranjo pomposo. O que era para ser mais uma canção de rotina de John, precisava de um B que ele não tinha composto ainda. Paul leva então a música a outra direção. Ainda assim, precisa-se de um final grandioso. Faz-se 'o som' então. George Martin o descreve como um "orgasmo sonoro grandioso". É tipo isso mesmo. E pro acorde final, várias mãos num mesmo piano: os 04 Beatles mais Mal Evans, gravando juntos 04 vezes mais através de overdubs e sincronizados naquele processo de bouncing. E sendo o fim de um disco como Sgt. Pepper's, o que não falta é estória. Como aquela do ruído percebido apenas pelos caninos. São 15,000 Hz! E o chamado "Inner Groove", hoje em dia um bônus das edições em cd, mas a idéia na verdade era usar aquela parte do sulco do vinil que não tem música, que serve pra gente lembrar de retirar o disco, e em muitos aparelhos a agulha fica ali, indo e voltando... Com um som um tanto bizarro, ao terminar Sgt. Pepper's você poderia ficar ouvindo aquilo indefinidamente até algum voluntário ir lá na vitrola e trocar o disco. Como diria Mr. Kite: a splendid time is guaranteed for all...

Total Time:
47:02

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quarta-feira, 16 de dezembro de 2009

Revolver [Mono Mix]

01 - Paperback Writer (Lennon/ McCartney)
02 - Rain (Lennon/ McCartney)

Lançado em 30 de maio de 1966, o compacto #12 da discografia Fab trazia uma sonoridade mais orientada para o peso das guitarras, baixo incluso. Até o volume da gravação na prensagem do 45' original era superior ao que se lançava antes. E na mix, nunca o baixo de Paul foi colocado tão "na cara". É certamente um sinal que o domínio de Macca na liderança do grupo já estava se consolidando. Além de peso, "Paperback" trazia arranjos vocais sofisticados, difíceis de serem reproduzidos ao vivo, o que seria uma das desculpas que eles usariam para abandonar os palcos alguns meses na frente. Já "Rain" aproxima ainda mais os Beatles de um som psicodélico, ainda em processo embrionário, mas experimentando vozes tocadas ao contrário, e alguns efeitos interessantes. Um excelente aperitivo para a bomba (no bom sentido) que explodiria no álbum a seguir.

03 - Taxman (Harrison)
04 - Eleanor Rigby (Lennon/ McCartney)
05 - I'm Only Sleeping (Lennon/ McCartney)
06 - Love You To (Harrison)
07 - Here, There and Everywhere (Lennon/ McCartney)
08 - Yellow Submarine (Lennon/ McCartney)
09 - She Said She Said (Lennon/ McCartney)

A capa já é um susto; nos créditos George é o compositor da faixa de abertura; na bolacha uma contagem por cima de um som de rolo de fita voltando, mais uma tosse (!)... A impressão é de que tudo é peculiar em Revolver. Para muitos é o melhor álbum dos Beatles pois ainda dá pra sentir um trabalho de banda, mesmo com uma "Eleanor Rigby" que é quase Paul solo (mais uma vez). O que interessa, as canções, são o grande trunfo enfim. Uma pedrada após a outra. O baixo de "Taxman" é funk dos bons, e solo rasgadão de guitarra também é cortesia de Mr. Macca. "Eleanor Rigby" é daqueles momentos inspirados e definidores de uma carreira, no caso a de Paul. Obra-prima sem par. "I'm Only Sleeping" é deliciosamente preguiçosa e traz guitarras ao contrário no solo, o que na época era grande coisa! E se o ouvinte desavisado achar que tudo ainda parece com Beatles, o que dizer de "Love You To"? Mais uma bola dentro de Harrison: a música indiana havia entrado em sua vida, e ele sabiamente trouxe essa linguagem pra banda e encontrou sua voz - um beatle que compõe música indiana com tempero psicodélico. A balada que segue é um respiro necessário após ouvir "Love u2", e "Here, There..." tornou-se mais um standard no repertório de... Paul McCartney!

Na mesma data de lançamento do álbum (05 de agosto), "Yellow Submarine" era também lançada em compacto, o 13º da carreira. Deve ser número da sorte, pois essa faixa de inspiração infantil cantada por Ringo renderia um filme de animação e um disco a ser comentado neste blog em breve. Mas a canção merece! A gravação é cheia de efeitos especiais e a letra por mais simples que pareça é rica o suficiente para inspirar um roteirista... Encerrando o lado 1 de Revolver mais uma piração: "She Said She Said" é clássico Lennon, com uma breve mudança de compasso (quaternário pra ternário) no B, e guitarras! Muitas guitarras...


10 - Good Day Sunshine (Lennon/ McCartney)
11 - And Your Bird Can Sing (Lennon/ McCartney)
12 - For No One (Lennon/ McCartney)
13 - Dr. Robert (Lennon/ McCartney)
14 - I Want To Tell You (Harrison)
15 - Got To Get You Into My Life (Lennon/ McCartney)
16 - Tomorrow Never Knows (Lennon/ McCartney)

O lado 2 começa com uma gravação peculiar, a primeira tentativa (séria) de Paul de emular o som dos anos 30-40, influência que ele recebeu de seu pai. Em "Good Day Sunshine" ouve-se basicamente piano (George Martin), bateria e vocais. E não é que funciona? As guitarras voltam com sede de gás em "And Your Bird Can Sing". O que domina é o som das Rickenbakers 12 cordas. Reza lenda que o baixo dessa gravação é de George, depois que Paul abandonou o estúdio. Realmente a versão do Anthology (aquela das gargalhadas) tem uma linha de baixo bem diferente... E o baladeiro-mor emplaca mais uma: "For No One" tem aquele toque nostálgico/ heróico de uma trompa (o trompista: Alan Civil), e melodia belíssima. "Dr. Robert" é o dentista que colocou LSD nos chás de John e George + esposas, e o que fazer com isso? Escrever uma canção, ora. A música tem uma parte B interessante, em suspensão, para depois voltar ao backbeat característico. A terceira contribuição de George é rock clássico, antes de isso sequer existir. Deve ser por isso que Beatles são criadores de estética, não de uma mas várias. Grande música, ainda acredito que "I've got time". É um bom lema. Já "Got To Get You Into My Life" é uma declaração de amor. Daquele mesmo tipo que o Black Sabbath cantaria 05 anos depois em "Sweet Leaf". E se mesmo talking about it a canção é pouco psicodélica com seu arranjo à Motown (com McCartney mandando umas frases pinceladas de James Jamerson com bastante propriedade), em "Tomorrow Never Knows" os limites não existem pro que se pode fazer em termos de experimentalismo num estúdio.

Tudo num mesmo caldeirão: pedaços de fita cortados
embrulhados em um saco plástico e conceitos avant garde seriam a contribuição de Paul para "Tomorrow Never Knows" (além de provavelmente o piano ao final da faixa, e o solo de guitarra, backwards), não esquecendo o baixão groovado em uma única nota contribui para o clima hipnótico da peça. Bass and drums: sem Ringo, essa música jamais teria "acontecido". Da forma que foi executada e gravada (a chamada master take) ela nunca poderia ter sido reproduzida. Um happening como outro qualquer. Isso porque para conseguir mixar os loops de fita (as "gaivotas"), tudo seria improvisado. Uma galera, várias máquinas de fita e alguns lápis. Esse foi o caldeirão cozido por John, motivado pela leitura de The Psychedelic Experience, que por sua vez era uma leitura do Livro Tibetano dos Mortos, e temperado pela música indiana - o centro tonal (Dó) é estático; mesmo com a única mudança de acorde, a nota mais grave (fundamental) continua sendo Dó. Uma música modal, que não segue um pensamento tonal (caracterizada por progressões as mais diversas). Uma idéia trazida aos Beatles através de George, claro. A tambura já havia sido apresentada lá na primeira esquina de Revolver. The end of the beginning.

Total Time:
40:59

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Part 1
Part 2

terça-feira, 8 de dezembro de 2009

Rubber Soul [Mono Mix]

























01 - Drive My Car (Lennon/McCartney)
02 - Norwegian Wood (This Bird Has Flown) (Lennon/McCartney)
03 - You Won't See Me (Lennon/McCartney)
04 - Nowhere Man (Lennon/McCartney)
05 - Think For Yourself (Harrison)
06 - The Word (Lennon/McCartney)
07 - Michelle (Lennon/McCartney)

Lançado em 03 de dezembro de 1965, o sucessor de "Help!" trazia um direcionamento musical bem mais sofisticado. É senso comum dizer que aqui começa a fase madura do quarteto. Mas é possível ainda fazer conexões com o álbum anterior, especialmente nas faixas com pegada mais country e folk. Por exemplo, "Norwegian Wood" comparando com "You've Got To Hide...", a diferença é que você não ouviria uma cítara naquele disco e aqui parece que a música não faria sentido sem ela. Difícil citar pontos altos num disco como esse, mas é digno de nota o solo de guitarra de Paul em "Drive My Car" que tem clara influência do som da Motown (assim como "The Word") - George gravou o baixo; também Paul gravou dois baixos em "Think For Yourself", um deles com distorção fuzz (o que ele repetiria somente em Abbey Road); "The Word" traz George Martin no harmônio e Paul no piano. "Nowhere Man" é das melhores safras de Lennon, não é à toa que o novo filme baseado em sua vida chama-se Nowhere Boy. Mas isso é papo pra outro post...

























08 - What Goes On (Lennon/McCartney/Starkey)
09 - Girl (Lennon/McCartney)
10 - I'm Looking Through You (Lennon/McCartney)
11 - In My Life (Lennon/McCartney)
12 - Wait (Lennon/McCartney)
13 - If I Needed Someone (Harrison)
14 - Run For Your Life (Lennon/McCartney)

O Lado B abre com Ringo mais uma vez numa postura country, mas dessa vez assinando a composição. Mas o negócio esquenta mesmo no meio da bolacha: o bucolismo de "In My Life", a quase-psicodélica "Wait" e as 12 cordas byrdianas de "If I Neeeded Someone" formam a sequencia definitiva para colocar Rubber Soul num patamar acima de quaisquer dos discos anteriores. Em um dos vídeos Anthology Paul clama a real co-autoria de "In My Life". John chegou a negar, mas segundo Paul ele fez a melodia principal para a letra de John. Sendo isso mesmo, parece mais uma coincidência cósmica com os Beatles: uma música nostálgica, que olha para o passado, talvez a última grande parceria de Lennon/McCartney num disco chave para entender a mudança de som que estava por vir. De Rubber Soul em diante, eles não produziram mais discos de rock 'n' roll, mas obras-primas que mudaram o mundo da música para sempre.

15 - We Can Work It Out (Lennon/McCartney)
16 - Day Tripper (Lennon/McCartney)

E na mesma data que Rubber Soul chegava às lojas, também era lançado um complemento: um 45 rpm que trazia mais uma inovação: ao invés do tradicional lado A e um lado B encheção-de-linguiça, o compacto era composto por dois lados A's. Quer dizer, as duas músicas eram singles. O Dj poderia escolher o lado que quisesse, não havia a indicação de qual era a música-de-trabalho (ou seja, o lado A). Na compilação Past Masters "Day Tripper" vem primeiro, o que funciona pois é a abertura do disco 2. Mas aqui respeito a ordem da coletânea vermelhinha (1962-1965), e também a preferência dos Beatles. É bem claro em entrevistas da época o quanto eles estavam orgulhosos de "We Can Work It Out". Possivelmente pelo harmônio tocado por John, ou a mudança de compasso breve no refrão, ou quem sabe pelo contraste das duas partes distintas, uma mais positiva (Paul) e outra mais realista (John). Não importa, é mais um clássico e é o 11° compacto da discografia (não perca a conta)!

Total Time:
40:38

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Part 1
Part 2

Obs.: Esse cd na caixa Mono traz como bônus o mesmo Rubber Soul em Estéreo, na versão descartada por George Martin em 1987. Essas faixas não fazem parte dessa compilação para download, e sinceramente, não consigo ouvir diferença dessa versão original para a atual, remasterizada e disponível em digipack nas melhores lojas do ramo...